Curso de Antibioticoterapia: Aula 1 - Uso Racional de Antibióticos

História dos Antibióticos

O primeiro caso de infecção tratado com penicilina G foi em 1941. O paciente melhorou, mas a quantidade de antibiótico era baixa, e foi necessário reciclar o fármaco a partir da urina do doente. Isso indica que a penicilina continua ativa na urina, e portanto não é metabolizada pelo fígado. Infelizmente, no final das contas, o paciente faleceu pela falta de antibiótico.

Obs: Os betalactâmicos (como a penicilina) costumam ser atóxicos e, devido a isso, podem ser utilizados por hepatopatas.

Obs: A maioria das infecções urinárias é causada por bacilos Gram negativos, que são imunes a penicilina.

Os betalactâmicos atuam sobre a camada do peptidoglicano da parede celular bacteriana. O problema é que os bacilos gram negativos possuem três camadas de muco polissacarídeos sobre a do peptidoglicano.

Obs: Em 1947 observou-se que 60% das cepas de Estafilococos aureus eram resistente à penicilina, hoje essa resistência é total. Em 1982, na guerra do Vietnã, constatou-se que havia resistência de Gonococos (bactéria causadora da gonorreia) à penicilina, sendo essa resistência, hoje, também total.

Bactérias são capazes de compartilhar material genético umas com as outras, através de plasmídios. Plasmídios são genes liberados em algum meio, que acabam sendo introduzidos em outras bactérias, alterando seu funcionamento. Esse mecanismo é o principal responsável pelo crescimento da resistência bacteriana, sendo chamada de resistência mediada por plasmídeo.

É dito que há resistência quando uma bactéria não é inibida, ou morta, ante uma concentração de antibióticos (“in vitro”), correspondente à que seria obtida no sangue do paciente durante o tratamento. Atualmente, em maior ou menor grau, TODOS os antibióticos são atingidos pela resistência bacteriana.

Principais Erros na Prescrição de Antibióticos

  1. Desconhecimento do espectro do antibiótico

    Ex: Prescrever um betalactâmico para uma infecção por bactérias gram negativas.

  2. Desconhecimento da farmacocinética do antibiótico

  3. Uso de doses abaixo do necessário

    O uso de doses abaixo do necessário causa resistência bacteriana e é pior que o uso de dose acima do necessário. O tempo médio de uso de um antibiótico deve ser de 7 a 10 dias.

  4. Desobediência à vida útil do antibiótico

  • Meia vida: Tempo na qual o nível plasmático do antibiótico cai pela metade.
  • Concentração inibitória: Concentração do fármaco no sangue necessária para inibir a atividade da bactéria.
  • Concentração tissular: Concentração do antibiótico que não fica no sangue, mas se concentra no tecido. Ex: 3 dias de azitromicina equivale a uma concentração tissular de 10 dias.

Decisão de Usar Antibiótico

1Escolha do Antibiótico

Diagnóstico, podendo ser até mesmo o clínico.

Ex: Infecção superficial da pele, da faringe ou das tonsilas = Estreptococo / Infecção profunda da pele = Estafilococo.

Ex: Pneumonia comunitária: 75% dos casos são causados por Pneumococos.

Ex: Meningite acompanhada de sufusões hemorrágicas = Meningococo.


Mas e se o caso clínico for uma sepse? Ou uma infecção urinária? Nesses casos é necessário um diagnóstico clínico laboratorial.

Ex: Hemograma, exame bacteriológico, exame sorológico e exames de imagem.


Obs: Leucograma indicativo de infecção bacteriana

  • Leucocitose (aumento na taxa de leucócitos)
  • Neutrofilia (aumento no número de neutrófilos)
  • Desvio à esquerda (maior atividade da medula óssea)
  • Eosinopenia (diminuição do número de eosinófilos)


Obs: Exceções à regra anterior

  • Febre tifoide e brucelose = leucopenia
  • Coqueluche = leucocitose e linfocitose
  • Escarlatina = leucocitose e eosinofilia


Associação de Antibióticos: Quando e para que Associar

  • Etiologia desconhecida (ampliar o espectro)
  • Infecções mistas
  • Infecções graves (potencializar os efeitos)
  • Sensibilidade variável
  • Resistência bacteriana (apenas monoclonal)

2 – Verificação da Sensibilidade do Agente Infeccioso

Agentes infecciosos anaeróbios são insensíveis aos aminoglicosídeos. A penetração dos aminoglicosídeos depende do consumo de oxigênio, portanto, se não há consumo de oxigênio, não tem como o antibiótico penetrar na bactéria.

3 – Diagnóstico Topográfico

É necessário analisar o local da infecção, com relação à farmacocinética do antibiótico. Por exemplo, em uma infecção urinária não podemos usar clorafenicol, pois o mesmo se encontra 82% inativo na urina. Outros antibióticos que não são recomendados nesse caso são: eritromicina e doxiticina, visto que ambos são eliminados em uma fração muito pequena, ou nula, pelos rins.

Outro exemplo importante são os casos de meningite, onde é necessário que o antibiótico entre no fluxo de líquor (liquido encefalorraquidiano), coisa que os aminoglicosídeos, assim como as cefalosporinas da 1a geração, não são capazes de fazer.

4 – Compatibilidade entre o Antibiótico e o Paciente

Os efeitos indesejáveis podem incluir:

  • Alergia – Antibióticos são uma das classes de mendicamentos com mais casos de alergia, principalmente os betalactâmicos, grupo da penicilina;
  • Toxicidade – Antibióticos podem ser: nefrotóxicos, mielotóxicos, hepatotóxicos ou neurotóxicos;
  • Irritação Química – Tetraciclinas e macrolídios costumam incomodar o trato digestivo;
  • Modificações biológicas no hospedeiro.

Sobre Toxicidade

Doses de antibióticos devem ser calculadas em mg/kg/dia, e para antibióticos tóxicos essa dose é fixa.

Ex: Polimixina E (5 mg/kg/dia) – Possui afinidade por fosfolipídeos da membrana celular, o que faz o fármaco atacar neurônios e, portanto, ser neurotóxico. Além disso, ele não é reabsorvido pelo túbulo renal, o que o torna nefrotóxico.

Caso o paciente tenha problemas na via de eliminação do antibiótico, é recomendado alterar a dose ou trocar o medicamento.

Via de eliminação debilitada = acúmulo de medicamento = problemas com doses que seriam normais

5 – Duração do Tratamento

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Obs: É importante sempre verificar interações medicamentosas!

Antibióticos e AINES: Praticamente todos os antibióticos se ligam às proteínas plasmáticas, assim como anti-inflamatórios não hormonais, o que gera uma disputa de ligação.

Tetraciclinas e substâncias alcalinas: Substâncias alcalinas, como antiácidos, provocam a quelação das tetraciclinas, impedindo sua absorção.

Antibióticos bacteriostáticos e bactericidas costumam agir sobre os ribossomos, atrapalhando a síntese proteica. Os ribossomos têm duas frações principais, a 30S e a 50S, caso sejam utilizados antibióticos que se liguem na mesma fração da organela, seus efeitos não serão somados.


Referências:

Curso de Antibioticoterapia da Liga de Clínica Médica (LCM) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

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